Caminhos para recuperação do comércio, de serviços e a importância de uma economia verde e digital: o segundo dia do Festival ODS 2021

O empreendedorismo feminino e a presença de Luiza Helena Trajano marcaram a programação do segundo dia do Festival ODS. Na abertura, houve entrevista de Paulo Hartung, presidente do Ibá e ex-governador do Espírito Santo. Já o encerramento do evento ficou por conta da entrevista com Flávio Dino, governador do Maranhão

 

Os setores de comércio e de serviços estão entre os mais afetados pelos efeitos da pandemia, resultando na precarização crescente do trabalho, assim como na queda da presença das mulheres no mercado de trabalho e nas oportunidades de renda. Essas foram algumas das preocupações que deram o norte dos diálogos no segundo dia do Festival ODS, evento promovido pela Agenda Pública, secretaria-executiva da rede Estratégia ODS, ocorrido entre 25 e 26 de maio. As temáticas foram escolhidas a partir do ODS 8 – Trabalho Decente e Crescimento Econômico. 

>>> Saiba como foi o 1º dia do Festival ODS

Em sua segunda edição, e totalmente online em respeito aos protocolos de combate à Covid-19, o Festival trouxe oficinas, palestras, entrevistas e cafés, debatendo e indicando soluções para a recuperação econômica inclusiva do país, como parte do enfrentamento aos reflexos causados pelo novo coronavírus. A economia verde e digital se mostrou um dos caminhos mais evidentes e possíveis, de acordo com as apresentações dos convidados.

 

Entrevista com Paulo Hartung no segundo dia do Festival ODS

A entrevista de abertura foi com Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo e atual presidente do Ibá (Indústria Brasileira de Árvores), conduzida pela jornalista Gabriela Lian, da Rede Globo. Para ele, a principal providência para a recuperação econômica inclusiva é a vacinação da população. “Tem efeito na saúde e impacto na retomada da economia, que deve vir também abraçada à sustentabilidade, à evolução da matriz energética e tantas oportunidades que a bioeconomia oferece”, afirma. “Até porque o vírus é sinal do nosso desequilíbrio com o meio ambiente.”

 

Hartung vê a precária infraestrutura do Brasil em diferentes áreas – como estradas, telecomunicações, saneamento, entre outras – como uma saída para geração de empregos no pós-pandemia. “É uma fraqueza porque tira competitividade dos nossos produtos e faz perder inserção no mercado. Mas, agora, pode ser bom se levar a geração intensiva de mão de obra.” É importante, porém, que sejam empregos de qualidade, formalizados e resultem em melhoria de vida para as pessoas. A educação, para o ex-governador, é fundamental nessa equação. “É nosso desafio histórico. A educação do povo brasileiro sofreu equívocos evidentes na condução, e no governo atual é um descaso absurdo. A transformação da educação precisa ser um objetivo de toda a sociedade.”

 

O papel dos governos locais na recuperação tem potencial extraordinário, nas palavras de Hartung. “Gestores precisam aprender a gerir o orçamento em mãos, criar ambiente de negócios. Têm prefeitura com tanta burocracia que é obstáculo para quem quer empreender, gerar renda, emprego. Mas o poder local tem muita força, pode atrair capital privado em contratos de concessão como coleta de lixo, energia, cuidado de parques. Aliás, é preciso humanizar a cidade, com mais espaço para pedestres e ciclistas. As cidades não podem delegar isso, que é economia verde também.”

>>> Assista a entrevista com Paulo Hartung na íntegra!

Sobre a Agenda 2030, Hartung disse: “Estamos caminhando. A sociedade está enxergando os problemas como os do clima. O jovem é um outro consumidor, que vai rastrear o que consumir, quer saber o pós uso do consumo e isso está mudando a produção. O problema é o tempo, que está contra a gente. Precisamos acelerar. Os 17 objetivos estão avançando enquanto planeta, a tecnologia ajuda. Sou otimista, mas com os dois pés fincados no chão.”

 

Impactos na realidade feminina

 

O segundo dia do Festival deu espaço para duas oficinas com foco em mulheres. Na mentoria “Mapa de Conexões – Para Mulheres Pretas”, as participantes construíram mapas de realizações para tirar do papel e guiar projetos futuros. Já em “Mulheres e pandemia: geração de renda, saúde e integridade”, foram apontados alguns dos desafios que empreendedoras vêm enfrentando com a crise do novo coronavírus, impactando oportunidades, ao mesmo tempo que resultam em sobrecarga de tarefas domésticas, familiares e profissionais. Uma lista de soluções foi desenhada para próximos passos em rede de apoio mútuo.

 

Na programação do dia, o festival também contou com a principal porta-voz no Brasil hoje das mulheres à frente de negócios, no mercado de trabalho e como líderes: a empresária Luiza Helena Trajano, presidente do conselho do Magazine Luiza. Ela foi uma das debatedoras do painel “Recuperação do comércio e setor de serviços”, ao lado de Francine Lemos, diretora do Sistema B, e de Ian Prates, pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

 

“Não é nem crise, é tempestade das maiores que já se viu e pegou todo mundo desprevenido”, diz Luiza, que destaca a rápida adaptação do Magalu à situação graças a 50% da empresa já ser digitalizada no início da pandemia. “Digital não é um aparelho, um suporte. É uma cultura que mexe profundamente com o modo de pensar da gente.” Àqueles que sofreram muitos reveses por conta do novo coronavírus, a empresária afirma ser importante refletir sobre o que os empreendedores e as empresas poderiam ter feito para estarem mais preparados. “Também há muitos casos de pessoas que conseguiram se reinventar. A gente é do tamanho daquilo que a gente vai atrás. Pensando no planeta, vamos sair dessa. Entra no movimento, assuma politicamente sua parte. Não é sair candidato, mas pensar no todo. Começa fazendo o possível e, de repente, você está fazendo o impossível. Larga as fake news.”

 >>> Assista o conteúdo completo do que rolou no Festival ODS na nossa playlist!

O pesquisador Ian Prates destacou uma especificidade da pandemia, quando o objeto de análise são as mulheres no mercado de trabalho: “dos dez setores mais afetados, cinco são femininos e seis negros, o que causa efeitos específicos e traz desafios adicionais não vistos em crises anteriores. As mulheres estão majoritariamente no setor de comércio e serviços. Além disso, há dificuldade de se reinserirem no mercado com a sobrecarga de trabalho doméstico não remunerado, serviços fechados, como escolas. Nossos dados mostram que 21% das mulheres não procuraram outro trabalho, porque tinham que cuidar de alguém, e 12% tinham menos possibilidade de acessar a internet.”

 

O que mudar e o que ratificar: Caminhos apontados na entrevista com Flávio Dino

 

A entrevista de encerramento, conduzida pela jornalista Eliana Trindade, da Folha de São Paulo, foi com o governador do Maranhão, Flávio Dino. “Promover a recuperação econômica inclusiva nos municípios e nos estados só é possível tratando do presente. O principal desafio é encontrar uma estratégia brasileira eficaz para enfrentamento da pandemia, que vai ganhando contornos de maior tragédia da história brasileira”, afirmou ele logo no início da conversa.

 

Dino acredita que é preciso ratificar que o Sistema Único de Saúde (SUS) é o grande vitorioso até o momento, assim como a forma federativa que dá autonomia aos estados. “Porque, se não tivesse papel de estados e municípios, a essa altura registrarmos o dobro de mortes.” O governador disse que a pandemia ressalta as desigualdades e os vazios assistenciais de regiões como a da Amazônia. Já a dependência de ciência e tecnologia levou ao drama das vacinas, que não são fabricadas no país, mesmo com instituições aptas para tal.

 

Os ODS, na visão de Dino, cumprem importante papel como referência na construção de políticas públicas concretas. “É evidente que, neste momento hostil que o país atravessa, não temos como concretizar em plenitude a Agenda 2030. Mas é um horizonte que nos faz caminhar, nos leva a direção correta para a melhora de políticas públicas.” Entre outros pontos discutidos pelo governador (confira o vídeo da entrevista na íntegra), esta é também uma fase de pensar o Estado de bem-estar social e a precarização do trabalho. 

 

“Mesmo aqueles que não têm lugar no mercado de trabalho devem participar, de algum modo, da vida socioeconômica, com políticas assistenciais compensatórias. Não é demérito ter política social para os que menos tem. É pressuposto civilizacional, não é sinal de falta de civilização. É cidadania e é positivo. O que precisamos é buscar alternativas de novas formas de trabalho que proporcionem oportunidades na economia verde, criativa, na bioeconomia. Gente não se descarta, se promove.”

 

Sobre precarização do trabalho, o governador ressaltou que o emprego precisa da proteção plena de direitos. “Deve ser um objetivo a ser alcançado sempre e que não exclui outras formas de trabalho humano. O que não podemos concordar com uma escravidão do século 21. Não tem jornada, previdência, descanso, férias, não tem mínimo. Isso é o que?”

 

O Festival ODS é uma realização da Agenda Pública e da Estratégia ODS. Teve patrocínio do Fundo Rein e cofinanciamento da União Europeia.

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